O projeto da tevê pública do governo avança. Gostaria de acentuar o que penso a respeito. Tevê pública e tevê estatal não se confundem. Esta é instituição a serviço do Estado e da Nação. Garante-lhe a imparcialidade um conselho representativo de todos os partidos e tendência culturais. É o caso, por exemplo, da BBC ou da RAI. Não hesitam em criticar, se for o caso, o primeiro ministro. Tevê pública é diferente, e aí cabe outra distinção. As públicas, nos Estados Unidos, levantam assuntos de interesse das comunidades a que se destinam e mantém orientação apartidária. As públicas no Brasil carregam outra tradição. Digamos, a Cultura de São Paulo neste momento cuida, não sem fervor, das conveniências tucanas. E como haveria de ser de outra forma, se o governador é José Serra? Pois é, a tradição é oligárquica e patrimonialista, seria de provocar câimbras na base da língua se a Cultura, de uma hora para outra, passasse a exibir uma imparcialidade irreprochável. Agora pergunto: por que o presidente Lula cogita da tevê do governo? Parece-me alimentar o propósito de oferecer à nação um noticiário isento, ao contrário daquele servido pelas emissoras privadas. Se não me engano, ele próprio não faz mistério de suas intenções. Mas seria capaz esta tevê à beira da santidade, honesta até as últimas conseqüências, de fugir às tradições, de subvertê-las, de cancelá-las? Vamos arriscar hipóteses: que diria neste instante a respeito do caso Renan? Ou sobre o julgamento do chamado mensalão? Permito-me dúvidas, dúvidas profundas, quanto à imparcialidade desta, e de qualquer outra, tevê pública no Brazil, zil, zil. País singular, onde os jornalistas chamam o patrão de colega, onde o sindicato confecciona carteirinha para o aludido senhor, onde os congressistas, em boa parte, são donos de jornais, revistas, emissoras de rádio e televisão. Disse singular, e apresso a correção: único.
Ipses literes...
(É assim que se escreve?)
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