quinta-feira, 10 de outubro de 2024

Não há espaço para discurso ideológico nas campanhas eleitorais?



Já há muito tempo que ditos especialistas em campanhas eleitorais afirmam não haver mais espaço para ideologia nestas disputas, em parte por causa da falsa premissa do fim das ideologias – como se isso fosse possível –, em parte por conta do alto uso de poder econômico nas campanhas eleitorais. O segundo argumento, em meu ver, tem mais pé na realidade, apesar de não se aplicar ao todo e Maceió é um bom exemplo disso.

Em relação ao primeiro argumento, toda produção humana é dotada de ideologia, sendo impossível fazer o que quer que seja sem ela. Agora, numa campanha eleitoral, cabe a forma de expressá-la. Aliás, no dia a dia da política e da vida cotidiana é preciso pensar na forma de se expressar ideologicamente.

Mas voltando ao resultado eleitoral, tanto à esquerda quanto à direita, quem apostou em campanha ideologizada e conseguiu – ou já possuía – razoável visibilidade foi bem votado.


Exemplos à direita: Leonardo Dias (PL), reeleito vereador com mais de 10.274 votos; Caio Bebeto (PL), filho do deputado estadual Cabo Bebeto (PL), não foi eleito, mas obteve excelente votação com 5.418 votos, ficando na primeira suplência da chapa; e Thiago Prado (PP), delegado de polícia e que faz o tipo xerife do velho oeste, foi eleito vereador com 6.802 votos. Todos fizeram campanha militante, inclusive, mas também é verdade que não tinham a mesma estrutura entre si.

À esquerda, temos os três nomes mais votados do PT. Pastor Wellington do Pinheiro obteve 2.759 votos. Ele é pastor evangélico e foi apoiado pelo MST. Em entrevistas que concedeu já na condição de candidato e discursos durante a campanha, sempre se afirmou contra o uso que a extrema-direita faz da religião e que sua candidatura era para combater esse campo político. Pastor apoiado pelo MST e que quer combater o que chamamos de bolsonarismo na Câmara Municipal. O que pode ser mais ideologizado que isso neste atual momento histórico?

Já Alycia da Bancada Negra obteve 3.025 votos. Na campanha, Alycia ressalta a importância de uma representação periférica. E só nome de candidatura “Bancada Negra”, neste momento histórico, é elevada ideologização de discurso. A Bancada Negra já vem disputando eleições e isso também os ajuda a consolidar um nome, além de terem atuação perene e não somente em eleições. Logo, já trazem consigo uma carga ideológica razoável. 

Por fim, Teca Nelma, reeleita vereadora com 9.969 votos. Na campanha em si, não houve ideologização nos mesmos níveis de Wellington e Alycia, mas o passado recente de Teca lhe deu essa característica. O mandato dela foi marcado por embates com a ala reacionária da Casa de Mário Guimarães e isso lhe permitiu a conquista de muitos votos entre o eleitorado progressista da capital alagoana.

Segundo pesquisa da Quaest, divulgada em 20 de setembro, cerca de 140 mil eleitores se identificam como progressistas em Maceió. O PT conseguiu 25 mil votos em sua chapa de vereadores. 

À direita, segundo essa mesma pesquisa Quaest, cerca 348 mil eleitores se identificam como conservador. O PL obteve para vereador 148.836 votos e, óbvio, esse montante tem influência da disputa para prefeito, vencida de forma acachapante por João Henrique Caldas, do PL.

Sem contar que, segundo pesquisas realizadas por todo o país, ao menos 50% do eleitorado escolhe seu candidato a vereador nos últimos dias de campanha. Portanto, não é sair da caixinha apontar que eleitores mais ideologizados escolheram os candidatos mais ideologizados. Esse movimento ajudou a elevar a votação dos nomes citados nesse texto, especialmente no final da campanha eleitoral.

Quem ousou ser mais ideológico na disputa para vereador conseguiu ser bem votado, sempre ressaltando as condições objetivas de campanha e o grau de visibilidade das candidaturas.

O resultado em Maceió mostra não haver razões para não ideologizar o discurso, ou tentar abrandá-lo, numa disputa proporcional. Eleições para vereador – e deputado – se dão por nichos e para ser eleito não se faz necessário ter os votos de todos os espectros do eleitorado. 

Por nicho entenda, território, segmento profissional, identidade ou discurso ideológico mais geral.

No caso do discurso, a conjuntura de cada eleição determina o foco, o tom e a intensidade de usá-lo. No atual momento histórico, à esquerda cabe a defesa da democracia, do direito às diferenças e da promoção da igualdade diuturnamente. Ou seja, combater esse fascismo à brasileira que, por falta de outro nome (como se precisasse), chamamos de bolsonarismo, todos os dias.

Isso significa ser sectário, exclusivista, nas disputas majoritárias? Não. Mas esse texto trata da disputa para vereador.

Ideologize-se! (Mas não seja sectário!) 

2 comentários:

Anônimo disse...

Análise muito boa, Cadu! Parabéns!

Ronaldo Alcântara.

Anônimo disse...

Ideologia é inerente, quando pensamos, quando agimos. O sectarismo deve ser evitado