domingo, 2 de novembro de 2025

Amizade, religião, política e a relação entre JHC e Lira estremecida “graças a Deus”

Imagem gerada por IA

O prefeito de Maceió, João Henrique Caldas (JHC), ainda no PL, e o ex-presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP) estavam distanciados, sem aparições públicas juntos por descumprimento de acordo entre eles em relação aos espaços na prefeitura de Maceió. Nem Lira entregou o que prometera, nem JHC deu musculatura combinada. O distanciamento entre eles ficou mais evidente quando iniciou o beija-mão para Marluce Caldas ser indicada ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Lira, segundo o noticiário, não endossava a indicação. Mas em 8 de outubro, no palco das redes sociais, JHC e Lira trocaram elogios e um caloroso abraço. Pronto, estava selada a (re) união.

Contudo, bastou a filiação de Gunnar Nunes, ligado à Assembleia de Deus, ao PP, saído do PL, ainda comandando por JHC, para a relação entre o prefeito de Maceió e o líder do centrão em Brasília estremecer novamente.

Gunnar, segundo consta o noticiário, seria peça-chave na chapa para deputado federal que JHC tenta montar para eleger a primeira-dama de Maceió, Marina Candia. Como torna ao acinte, o prefeito de Maceió exonerou, de bate-pronto, 52 cargos comissionados ligados à Assembleia de Deus. As indicações também era do deputado estadual Mesaque Padilha, do União Brasil, que ainda mantém federação com o PP, de Arthur Lira, que também corre atrás de montar uma boa chapa para a Câmara dos Deputados a fim de eleger seu filho, Álvaro Lira.

Arthur Lira é pré-candidato ao Senado e quer repetir a dobradinha que teve com seu pai, o finado Benedito de Lira. Pai no Senado, filho na Câmara dos Deputados.

Além dos cargos, que rendiam cerca de R$ 200 mil aos comissionados, em agosto deste ano, JHC doou um terreno no valor de R$ 15 milhões à Assembleia de Deus para construção de sua sede. A vultuosidade dessa relação, além do potencial de votos aqui envolvidos – Assembleia de Deus tem cerca de 200 mil fiéis em Alagoas –, foram fatores determinantes para o desconforto de JHC com a filiação de Gunnar ao PP.

Esse episódio escancara dois aspectos da política. O primeiro é que ninguém é amigo de ninguém nesse meio, apesar do que as falas públicas fazem parecer junto ao eleitorado. No máximo, se há relação pessoal de amizade, ela fica secundarizada perante os interesses políticos. Estamos falando de profissionais da política e, até aí, está tudo certo.

O segundo é a mistura de política com religião, cujo objetivo é manipular a fé das pessoas, especialmente aquelas que não sabem bulhufas sobre como funcionam as engrenagens da política. Por religião, entenda as estruturas organizacionais das igrejas, não o credo (cristianismo, catolicismo, evangélicos, espíritas, candomblé etc).

JHC se diz evangélico e sempre publica trechos bíblicos em suas redes sociais – “se diz” porque não o conheço, logo, não sei se a fé que demonstra em público condiz com a verdade – e sempre fez uso político dessa seara.

Fosse somente o prefeito de Maceió, a mistura entre religião e política nem deveria ser tema de discussão, mas não é o caso. É, cada vez mais, crescente a exploração da fé como cesta de votos, o que rebaixa o debate público a questões morais e à imposição de uma crença sobre as outras acerca de como o Estado deve funcionar, que serviços deve prestar e como prestar.

Já há algum tempo não é raro vermos candidatos de todas os matizes partidárias e ideológicas, especialmente a cargos majoritários, fazer beija-mão entre líderes religiosos; a vermos casas legislativas aprovarem leis sob a ótica da leitra bíblica que cada vertente do cristianismo diz possuir ou a aprovações isenções fiscais e até – como o caso do prefeito de Maceió e a Assembleia de Deus – doações de imóveis públicos.

No Renascimento, passou-se a tratar o ser humano com o centro das coisas públicas, das expressões artísticas à atuação do Estado, deixando de lado o poder da igreja nas decisões políticas, dando vez ao Iluminismo. Agora, em pleno século 21, estamos à beira histórica de voltar aos padrões de relação entre fé e Estado da Idade Média, mas com o plus das tecnologias de comunicação deste século.

E sobre amizades na política, quando os interesses coadunam, tudo certo nada errado. Quando, não, “nos vemos nas festas de fim de ano”.

No caso entre JHC e Arthur Lira, o que vale muito mais amizade – se é que existe – são as eleições de 2026. Lira quer ser Senador numa disputa, se possível, tendo somente Renan Calheiros (MDB) como adversário num pleito que se elegem dois senadores. JHC até agora não fala abertamente para qual cargo irá concorrer. Fala-se que será a governador contra Renan Filho (MDB), apesar de ser mais fácil para ele concorrer ao Senado, ameaçando Arthur Lira.

Por conta a reação de JHC à filiação de Gunnar ao PP, Lira, segundo o noticiário, já foi atrás de Davi Davino Filho (Republicanos) para “trocar uma ideia” sobre o ex-deputado estadual concorrer ao Governo de Alagoas. A família Davino é dona da Funbrasil, que realiza serviços médicos – pagos, ao menos majoritariamente, pelo SUS – a idosos em toda Maceió, o que rende muitos votos à família. É oóbvio ululante que a sondagem a Davi Davino Filho por Arthur Lira é para ir para cima de JHC, que tem sua principal cesta de votos na capital alagoana.

 E se for para jogar o jogo nesses moldes, não custa muito para JHC se bandear para o lado de Renan Calheiros, até como parte do cumprimento do acordo político que fez Marluce Caldas ir para o STJ: JHC num partido da base de Lula.

Mas se a Assembleia de Deus garantir votar em JHC e JHC não se colocar numa posição que Arthur Lira entenda que lhe atrapalhe, a “amizade” volta. “Graças a Deus”.

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